Sinais de Família

       A diplomacia social toma conta da moral e dos seus fins, tudo parece reduzir-se a gestos simples que nem sabemos ao certo se os estamos a interpretar bem!

      – Posso ver? – perguntei com delicadeza e respeito pela idade daquela linda senhora!

      – Esteja à vontade, menino! – exclamou, com apreensão e curiosidade. E com alguma pacatez e mansidão, lá foi dizendo: – Veja que há coisas muito bonitas e boas!...

      Tenho no meu temperamento a ingenuidade consentida de tudo ver e apreciar com espontaneidade e elevação. Dou valor às coisas e às pessoas sem estar preocupado com o que sinto sobre esta atitude.

      Passou um certo tempo em que me preguei ao enlevo daquela senhora e à voz com que atendia os outros compradores e que eram mais efémeros.

      – Já viu o que queria? – perguntou com insistência.

      – Já, já vi o que queria, estimada senhora – respondi em tom interrogativo. Foi esta voz menos adocicada e mais altiva que me integrou no meu gesto social, mas sobretudo no meu gesto de amor, para trazer sempre objetos de recordação das terras que visito.

      Como se acordasse após esta meditação, animei de novo e escolhi naquela montra onde a linda senhora as tinha em exposição, um conjunto de prendas; objetos que distinguiam os meus sentimentos de partilha afetiva. Nós gostamos dos filhos por igual, mas concentramo-nos no gosto de cada um e excitamo-nos como eles se excitam nas suas preferências particulares.

      – Quanto é? – perguntei, com algum carinho.

      A senhora olhou-me profundamente e demorou algum tempo a responder. Não sei se eu lhe fazia recordar alguém. Um filho, talvez! Quem sabe…? Como não tinha máquina de somar e as parcelas eram várias, pegou num caderninho e começou a rabiscar os números. “– Um,… mais três…; mais sete…; são…”, a memória faltava‑lhe e eu tinha-lhe tomado a emoção. Eu não era um qualquer! Não era, porque ela olhou-me com profundidade e também ficou presa a mim.

      – Some o menino! Já tenho alguma dificuldade! A vista já não é o que era – dizia a senhora em comentários divinos.

      Peguei no caderno e somei rapidamente a conta. Tirei o dinheiro do bolso e paguei‑lhe. Julgo que não me enganei a somar e que lhe paguei o que ela me pediu; atesto o que digo com emoção e profunda gratidão, por ter confiado em mim e por me ter avivado o meu sonho, de lembrar-me sempre de todos os sinais de família.

Macedo Teixeira