Sementes da Verdade

18-01-2013 15:46

SEMENTES DA VERDADE

TERCEIRA PARTE

DO ESTADO PARA A POLÍTICA

 

IV

Uma comunidade comunitária das Nações e dos Estados não poderá ser bem constituída sem a consideração primeira das Nações e características

 

    Uma comunidade comunitária das Nações e dos Estados não poderá ser bem constituída sem a consideração primeira das Nações e características que cada um e cada uma evidencia, quer na sua formação geral, quer na sua formação específica. Não poderá ser bem constituída na integração plena dos Estados e suas consciências ético-jurídicas, se as características nacionais, humanas e valorativas, não forem a bandeira de comunhão comum nas identidades caracterizadas, porque algum tempo depois de se terem integrado, as comunidades apelam para estas características, que sempre especificarão a sensibilidade de origem. Se assim não acontecer e se teimar pela massificação das sensibilidades, não se reconhecendo a essencialidade acima do movimento, o conhecimento acima do aleatório, nem singularmente as Nações, nem particularmente os Estados que as representam, cometeremos um gravíssimo erro, de os Estados perderem o poder que lhe vem da soberania e da decisão na vontade do seu povo; com a agravante de estes se transformarem em agregados de estados de poder, sem filiação específica, sem vontade própria e na dependência das leis ético-jurídicas e político-institucionais, que os organizam com poderes de decisão, mas sem motivos para decidir.

    No interior dos agregados comunitários nascem projectos construtores, que visam a edificação da comunidade e o desenvolvimento planificado, das suas políticas economias e culturas, mas no exterior continental, desenvolver-se-ão sempre projectos, que exigirão poder de liberdade criativa e emancipação de vontades, na aventura e na mudança nos planos que estabilizam a ordem, mas não preparam o progresso e a singularidade de cada ordem social. Não se podem transferir para um único centro todas as decisões e planeamentos, assim como não se podem transferir todas as vontades para um único local.

    Assim, todos os meios de agregação dos interesses e vontades nas finalidades comuns devem contemplar o gosto e fascínio pelo rumo imprevisível; o que é o mesmo, pelo pulsar natural de todos os valores activos e accionados por todos os agentes e meios que possibilitam a passagem às condições de outras características mais revitalizadoras da estabilidade dos sistemas, na sempre ansiada mudança. Entretanto, estes nunca deverão ser meios de impedimento das opções humanas, na escolha dos rumos a seguir, para realizarem com maior independência e criatividade voluntária os desejos de serem semelhantes nos compromissos, iguais no acatar dos princípios, mas diferentes nas maneiras de actuar e construir os seus próprios destinos, em seguimento dos sinais que a consciência lhes vai indicando seguir.

    Não se deve estar preocupado com o desalinho dos modelos, se o alinhar de interesses e actividades se disciplinar pela ordem e organização dos Estados; se a diversidade não fosse a fonte da escolha dos rumos da criação e independência, porque seríamos tão diferentes no desejar e tão distintos na revelação dos talentos e ocupação das vontades?

    A diversidade é a fonte donde brota o Tempo que marca o compasso das mudanças em geral, e que limita o tempo de cada um nos intervalos da criação individual e no preenchimento de tais intervalos, pelos sinais encontrados na multidão e pelos factos e ideias que se dirigem a todos em geral e a cada um em particular; pois, em cada intervalo, a atenção dispensa-nos os elementos e o plano com que havemos de realizar as diferentes partes da Obra para que nascemos e somos alimentados. Simples ou complexa, aos olhos dos demais semelhantes, mais perfeita ou mais incompleta nas contemplações de todos, mais individualizada ou mais colectiva, será sempre a Obra que o destino nos foi marcando, com dor ou alegria, com maior atenção ou maior imprevidência.

    Na diversidade, percepcionamos o nosso tempo e as nossas funções; aprendemos a escutar o destino, que é fonte dos nossos sonhos e que é caminho da nossa realização; e aprendemos, sobretudo, que onde activamos um teclado e fazemos soar um acorde, estão os limites do nosso espaço e do nosso tempo que não colidindo com os demais, activam só o destino para não se quebrarem os sonhos. Na diversidade se descobre que, não podendo combinarmos todos os segredos, eles se combinam em nós nos diferentes sonhos e ideais, onde o destino se evidencia e subtilmente dirige a nossa ordenação, na ordem mediadora que nos leva ao seu total encontro e seu majestoso poder.

    Homem e destino encontram-se, Estado e Nação reconhecem-se, povos e comunidades identificam-se, sem fatalismo nem angústia; porque, senhores do nosso destino, só poderemos sentir mais felicidade, conforme formos encontrando nos sonhos que vão nascendo, aqueles que forem as partes que nos tornem mais consistentes e aprofundem a aprendizagem.

    Toda a integração, para ser eficiente e perfeita, tem que contemplar estas possibilidades e criar condições de se tornarem em fontes que todos possamos escolher, entre diferentes alimentos, mas que ninguém pode manipular nem impedir nos limites.

    E é por estas e outras dificuldades que devemos reflectir profundamente nos deveres dos Estados para com os Povos e Nações; sobressaindo nestes, os de desenvolvimento das fontes de riqueza e de criação, que não podem pôr em causa a distinção e características, já que o contrário põe em risco a soberania e fragiliza o poder. Todos os Estados, através dos seus legítimos representantes, terão de criar condições de integração e prática dos lances criadores, que sinalizam o espaço que forma o arquear do pêndulo pelo relógio da Vida e pelo desenvolvimento desta, mas todos terão que estar atentos, que a união se faz pelos sinais que marcam esse espaço, que, sendo comuns a todos, não permitem indistinções porque são partes diferentes de um arqueado do pêndulo, que se move eternamente e que bate as horas, sem que ao mesmo tempo ouçamos todos os mesmos sons.

    O que os Estados terão que fazer sempre, são exames atentos das concepções a adequar a todas as práticas, na identidade perfeita com as marcas que limitam os seus poderes e as sociedades que os constituem, para que a sua acção seja mais límpida e, em consequência disso, possam ouvir no bater das horas do Universo os sons do teclado que corresponde a cada um, em harmonia e sem dor nem esforço consternado.

    Cada Estado terá que justificar a integração dos interesses no imperativo da Ordem integradora da Nação e, sempre que possível, na ordem integradora dos povos; pois, apesar das dificuldades, é possível a adaptação das vontades aos interesses da Ordem dos povos; no entanto não existe adaptação possível dos interesses que sejam oriundos de outras pátrias e que não se localizem nos interesses da Nação. Ninguém pode possuir o que desconhece e que, por vontade própria, pode vir a adquirir; como também, ninguém pode praticar substituições nos hábitos da consciência, da mesma maneira que nos locais de uma casa. Substituir objectos por outros objectos, não é a mesma coisa que substituir ideias por outras mais adequadas. A consciência humana adapta-se progressivamente à mudança, porque deseja mudar, mas resiste em ser caduca; e na resistência, cria concepções de defesa que bloqueiam os objectivos da própria mudança, e na maioria dos casos, mudam mais depressa os propósitos da resistência do que os propósitos do desenvolvimento.

    Daí que, tem que ser nos poderes dos Estados e na legitimidade dos seus interesses superiores, que se tem que exemplificar, tantas quantas as vezes necessárias, até que a resistência dos povos, seja na procura de formas que escapem à dor, por incompreensão que se tem no praticar o que legitimamente se acorda.

    Por isso, os Estados, pelos organismos constitucionais, legais e jurídicos, que são o suporte material e prático dos modelos, dos desejos e vontades dos povos, têm que exercer acção fiscalizadora e pedagógica, dos princípios constituídos em legítimas vontades, para que as práticas sejam coincidentes com os modelos constitucionais, que com tanto sacrifício se escreveram e se instruíram.

    As Nações reflectem a diversidade das práticas e a habilidade no manuseamento dos instrumentos institucionais e jurídicos, pela unificação e ordenamento da organização criadora, das diferentes sensibilidades na atenção dos exercícios pendulares da vida de cada Estado; as Nações definem-se em cada uma das comunidades habitacionais e sociais dos seus filhos, brilham pela articulação perfeita das diferentes características e focalizam-se no rumo à Eterna Verdade, pela acção directora dos Estados, que presidem e a governam.

    As Nações são itinerantes e hospitaleiras, aguerridas e criadoras; os povos que as constituem são as bases destas riquezas, mas que naturalmente, pelas diferentes sensibilidades e estados de poder muito variáveis, ganham em exercícios criativos e perdem em estabilidade de raízes; logo, terão que ser os Estados pela sua eficácia e práticas de recordação, a fazer com que as leis e normas não sejam de desfiliação nacional e actuem como pedras que pesam mais em cada mão, quando se agarra mais a “festa” que as razões que a fundamentam.

    Assim, na itinerância vive-se em comunhão com a Verdade, onde quer que ela actue; onde quer que estejamos e quem quer que seja, que para ela apele; estaremos nos outros, sem ser necessário estar em todas as características da “festa”. Os seus fundamentos serão a Ordem; os princípios, as bases em que se solidifica, e a Verdade, o instrumento que sensoriza aquele que dela arreda.

    Pelos Estados se representam e se governam os focos das itinerâncias nacionais e internacionais, com os povos e suas acções corrigem-se sentidos e direcções de rumo e encontram-se os elementos que ordenarão em desenvolvimento dos planos, em que os estados se estratificam, se libertam e se exercitam.

    Na itinerância revelam-se com seriedade e beleza os costumes e hábitos que estratificam os povos, saúdam-se as diferentes Nações e reúnem-se as diversas sensibilidades. Na itinerância das raízes, vêem-se soltar as características diferentes da Liberdade, do sucesso e da glória dos povos e Nações; vêem-se soltar os sentimentos de adesão ao calor que nos une como humanos, em terras estrangeiras e nacionais, e vêem-se revelar os bens que sejam nossos ou dos outros, nos seus sucessos com glória e nos seus poderes com valor.

    As comunidades, e as ordens que as constituem, têm que revelar-se nestas preocupações, sem vontades de hegemonia nem de dominação de qualquer espécie; têm que ser factores de reunião franca e amistosa, singular e livre, permitirem a exibição de todos os fluxos culturais, políticos e económicos, para se reflectir no sentido das suas itinerâncias e lhes descobrir as oportunidades da sua projecção nos diferentes povos que os acolhem, mas que não poderão estar obrigatoriamente obrigados em os consumir sem gostarem.

    As ordens comunitárias dos Estados e das Nações têm que ser construídas pela idealidade da forma; isto é, têm que ser espaços de consulta e de encontro, de recolha, de análise e de abrigo, ou seja, dito de uma maneira mais simples, têm que ser os espaços onde todos os projectos para os “óscares”, acontecerão em resultado de síntese, sem que para o efeito, aí sejam previamente sancionados, cabendo desta maneira ao melhor projecto, melhor reconhecimento, e aos melhores resultados, a maior adesão.

    A soberania dos Estados tem que se exercer de si para si e de si para os outros, mesmo que a ajuda seja o sinal do apelo quando um Estado estiver em crise, mas nunca será razoável nem justo que, para se salvar o corpo, se perca a liberdade da alma. E se, a liberdade de um povo ficar subjugada pelos sistemas de planificação sobre o que há-de ser o melhor “filme”, mesmo que as sensibilidades dos povos não o tenham reconhecido, é a Liberdade da Alma que não se projecta nas diferentes itinerâncias, nem se revela por espontaneidade; não haverá bons projectos se os “filmes” forem escolhidos, sem previamente serem “apanhados” pelo povo. Ver-se-á o que se escolhe, e não o que deverá ser escolhido, pela adesão da diferença, da riqueza e do significado, para o desenvolvimento dos povos e para a solenidade dos Estados.

    Se os sistemas jurídicos e institucionais relevarem a consulta, o abrigo, a análise e a recolha, sem condicionarem a decisão nem aplacarem a soberania dos Estados, são bons instrumentos de ordenação e simplificação, constroem-se pela idealidade da forma em projecção itinerante de todas as formas ideais e das diferentes práticas na aplicação destas formas. Mas, se não se considerarem estes aspectos, tornam-se em meios de contenção e impedimento, em que cada Estado puxa a “brasa para a sua sardinha” e que, conforme a força do calor e o volume do combustível, assim serão os resultados; e se o equilíbrio se estabelecer por pressão, ninguém puxará muito para que não se descubra como puxa e que interesses tem nessa acção. E para que não se rebentem as amarras do “barco” que se construiu, para garantir algum sentimento de adesão e alguma solidez na expansão de capitais e produtos, simula-se algum acordo, para se estar bem na Ordem, sem com a Ordem se estar.

    É muito conveniente, por isso, que os sistemas sejam sempre, mais de ordenação e síntese do que de construção e de controlo: os grandes campos amarram sempre alguém a si mesmos, pela extensão ou pela propriedade. Se amarram o agricultor à casa pela nobreza da propriedade, ele sai para plantar, mas regressa para se guardar; é como se se amarrasse aos valores da propriedade. Mas se amarram o agricultor aos campos, pela extensão e poder, ele fascina-se e engrandece-se, mas perde-se entre os limites do que é seu e é para si, e o que é dos campos e para os outros.

    A integração só será perfeita, se contemplar a vontade do “agricultor”, que conhece o que cultivar para si e seu bom gosto, que reconhece que os diferentes “sabores” são propriedade de todos; que a fortaleza dos campos e a riqueza das colheitas não dependerão profundamente de si, e que reconhece, por certeza, que vale a pena “cultivar”, porque o que é seu está acautelado, o que é dos campos está “guardado” e o que for para os outros será saboreado, reconhecido e estimado. 

 

Autor: Macedo Teixeira; Obra: Sementes da Verdade; Fotocomposição e Impressão: ROCHA/Artes Gráficas, L.da; Julho de 1992; págs. 97 e restantes.