Sementes da Verdade

21-12-2012 16:55

SEMENTES DA VERDADE

TERCEIRA PARTE

DO ESTADO PARA A POLÍTICA

 

II

Está na Ordem da Vida e na vontade da nossa espécie, a mudança e a descoberta

 

    Diga-se, em abono da Verdade, que está na Ordem da Vida e na vontade da nossa espécie, a mudança e a descoberta, em como mudar sempre para melhor, e para nos tornarmos diferentes. Mas, em abono da Verdade, deve-se dizer também que, para podermos mudar e procurar os diferentes limites das diversas mudanças, a Verdade não pode mudar no mesmo ritmo dos sabores e das entusiasmantes vontades; sobretudo, no que se refere aos Estados, à organização dos povos, à organização dos poderes institucionais e políticos e ao dinamismo da partilha dos valores que estabilizam e honram as diferentes nações. Não se pode justificar as coincidentes e precipitadas mudanças ao ritmo das emoções políticas, vindas do exterior ou nascidas nas agitações mais descuidadas; pois, como se compreenderá, estes movimentos provocam emoções que alteram as mentalidades de qualquer povo, desenvolvem ondas de choque, que só poderão ser controladas pela especialização segura, de se estar a mudar nos Estados sem se mudar o Estado radicalmente, na sua natureza e funções, nem ao ritmo das emoções e vontades de mudar sempre, e de tudo mudar para sempre.

    Os interesses dos Estados têm de estar acima dos interesses de quaisquer legítimos desígnios das populações e de todas as comunidades que as fundamentam e organizam. E dos desígnios mais interessantes da política, que residem na emoção criadora e combativa de desenraizar as ideias que tendem, por vezes, a estratificar as vontades e a acomodar os sentimentos.

    Os interesses dos Estados têm de estar acima dos interesses da Ciência Política, quer como transformadora, quer como criadora; pois se reflectirmos de novo na concepção de Estado, “como agregado humano”, descobriremos, imediatamente, que os lances políticos abalam as estruturas de qualquer Nação, nas lógicas da Ordem e da organização pública; pelo que, se tivermos em consideração os interesses do Estado acima dos interesses políticos, que são, como se compreende, os verdadeiros guiões da planificação de todas as acções lógicas, ainda que os lances políticos nos fascinem e nos transtornem, não dominam por avassalamento o Estado nem desviam a ordem pública ou confundem o sentido do Poder.

    Os lances políticos são movimentos migratórios das ideias, que estabilizam a ordem natural da mudança e edificam as civilizações crescentes; são sementes plantadas em espaços, tempos e factos irregulares, que brotam em sonho e fascinam por mistério, até se tornarem em realidade prática e assimilação planificada e institucional. Daí o seu carácter de fascínio e empolgância, das vontades humanas e dos corações mais francos e mais libertos para as acolher.

    Mas, se toda a ordem natural repousa sobre a mudança e transformação, repousa acima de tudo, sobre a estabilidade e sobre a eternidade dos poderes do Estado; pois são eles que garantem os poderes transformadores do povo e aguentam os poderes políticos de necessidade de ajustamento e nivelação. O Estado funda-se em princípios e, tal como nos ensina Aristóteles, “os princípios não derivam de nada”, é preciso intuí-los, logo, a Intuição conduz-nos no seguimento dos guiões, até se tornarem em regras, em normas e em leis que, por consequência, activam os novos lances políticos. E se os princípios não derivam de nada, eles fundam-se no Poder de que emanam e em que se exercitam; no poder do Bem, da Ordem, da Justiça e da Seriedade e exercitam as comunidades humanas de qualquer Estado no seguimento destes rumos, porque neles residem a Vida e a Verdade, o Homem e a História.

    Os interesses do Estado têm imperativamente força de condução e de Ordem sobre todos os outros interesses; isto percebe-se e atesta-se, em todos os intervalos de tempo que separam a construção das regras e das leis, pela aplicação e pelo cumprimento dos princípios que fundam a ordem instituída.

    Não se podem colher frutos sem se plantarem as sementes, mas também não se pode distribuí-los sem se recolherem das árvores; e enquanto não se realizam estas normais acções, percorre-se o caminho nos sucessivos intervalos, com os frutos que já colhemos das sementes de que derivaram. Os interesses dos Estados derivam, entre outras razões, da sensibilidade e lealdade aos objectivos percorridos pelos seus cidadãos, na conquista, na organização e na criatividade. Interesses florescidos e estabilizados nas Nações que definem e governam todos os diferentes espaços e valores que formam os Estados; laços de emancipação e recolha dos lances culturais, criadores de unidades estéticas da vida humana e da cultura universal.

    É no interior das consciências humanas e no interior das diversas consciências políticas e culturais, que as Nações se distinguem e se enriquecem; neles se forçam a unificação e organização permanentes, em reforço dos poderes do Estado, que garantem a perenidade do espaço que habita e a estabilidade de todos os movimentos sociais, políticos, económicos e de outras ordens e características culturais. E é nos mesmos interiores que as Nações fundem e estabilizam os sentimentos de mudança e de desenvolvimento; neles se agigantam a defesa nos interesses colectivos e particulares, da Pátria e das comunidades que a formam.

    Uma Nação é tanto mais reconhecida e respeitada, quanto mais solidária e coesa for na partilha natural dos deveres e direitos, responsabilidades e obrigações e de todos os princípios que uma tal rectidão exige. Nesta partilha e nestes valores sente-se a realidade nacional, e as realidades caracterizadoras da vitalidade dos filhos que definem a comunidade nacional. Todos os empreendimentos realizados, e a realizar, chocam e sensibilizam, pela grandeza da Nação e pelo seu poder criador, mas é o sentimento unificador da Pátria que avassala e agiganta o ténue calor gerado em cada uma das obras realizadas por cada um dos cidadãos, ainda por muito simples que lhes pareçam e a sua importância, na ocasião, não pareça ter sentido.

    Uma Nação pode ser muito grande e não ser reconhecida e respeitada pelo seu povo e pelos povos e nações do mundo, que habitam solidariamente, por comunhão de interesses e por filiações ideais de movimentos e conjunturas, que sejam de compromisso no exercício da vontade para a realização de fins semelhantes. Pois não é a grandeza do espaço, nem a quantidade de cidadãos, que fazem uma Nação poderosa; quando muito, tornam essa Nação aos olhos do Mundo, em sinónimo de admiração e de estranheza, por tamanha extensão e por um tão grande número de pessoas, ao qual ninguém mais quer pertencer. O que torna poderosa uma Nação são essas ordens, não no plano da literalidade quantitativa, mas nas dimensões criativas de organização e de eficácia dos poderes e dos princípios; sobretudo, se esses princípios e esses poderes inspiram modelação nos outros e motivam na comunhão das comunidades, pela Ordem e rigor no Bem do Poder e no bem dos Estados.

 

 Autor: Macedo Teixeira; Obra: Sementes da Verdade; Fotocomposição e Impressão: ROCHA/Artes Gráficas, L.da; Julho de 1992; págs. 87 a 89.