O Vale e a Montanha

05-04-2013 16:16

O Vale e a Montanha

Macedo Teixeira

    Entre o Vale e a Montanha vive um sonho de silêncio e de distância, tão semelhante ao sonho da grandeza que se vive e se experimenta, na distância que nos separa no que queremos realizar e do que em cada dia vamos realizando.

    Há uma distância calculada pelos atos do nosso dia-a-dia e um sonho que vai sendo realizado em cada uma dessas metas que percorremos e que nos levam até ao silêncio da certeza; que a grandeza que se vive e se experimenta, na vontade de se ser alguém, se torna possível e realizável. A certeza do que ouvimos um dia, àqueles que nos inspiraram acerca do Mundo e dos seus elementos, da sua natureza e da nossa responsabilidade na sua consequente transformação e mudança, não era uma história, a que só eles como mais velhos tinham tido acesso, mas que nós como jovens só poderíamos sonhar, mas não ver a realidade, nem sequer superar o seu próprio sonho.

    De facto, só o entusiasmo e o tempo pareciam estar a nosso favor; o entusiasmo para sermos um dia semelhantes aos que ouvíamos, ser como os professores, os pais ou os amigos mais velhos; o entusiasmo de também um dia, nos tornarmos capazes de disputar a aventura e o credo na nossa inteligência e gosto pelo servir a vida e adquirir toda a satisfação que em cada dia víamos os outros viver; os que nos ensinavam ou aqueles que nos favoreciam no respeito e na distinção de serem mais velhos no meio da nossa juventude. O tempo que nos sossegava, porque era necessário esperar a altura certa e a idade perdoava qualquer atraso na colheita dos conhecimentos e ensinamentos; éramos suficientemente jovens para nos prepararmos para o futuro. Tínhamos a nosso favor estes dois aspetos fundamentais que nos davam força e esperança de um dia virmos a ser alguém; talvez, como os nossos pais ou os nossos avós, quem sabia!

    Era o desejo de imitação nas grandes obras e nas grandes causas; na justiça, no amor, na liberdade, no empenhamento; nas causas que entusiasmam qualquer jovem e qualquer pessoa mais velha; as causas, afinal, pelas quais lutamos para sermos homens num reino diferente dos reinos naturais.

    Valeu a pena esperar, dirão aqueles que estão hoje na inquietação da vida e na realização dos desejos por que tanto ansiavam; outros dirão, debaixo da dúvida, que a vida é uma ilusão e que os sonhos que lhes ensinaram a sonhar não passavam de construções sociais necessárias ao interesse da sociedade; outros ainda, quem sabe! estarão a sofrer as penas de um futuro pouco orientado ou de soluções sociais sem sorte e sem riqueza, vivendo atrás de grades ou numa fuga à vida e à sua maravilhosa doçura, para salvarem o corpo, até que as teias da Lei não deixem antecipar mais o tempo, nem fugir para mais lado nenhum. Planos semelhantes a vales, onde vivemos a nossa vida e a desejamos manter intocável, no sonho de a realizarmos pela subida até às montanhas da nossa imaginação; sem nunca nos perdermos, nem perdermos a certeza de que valeu a pena esperar pelo dia de sermos homens, como foram os que nos acompanharam quando ainda éramos crianças.

    Entre o Vale e a Montanha vive um sonho de silêncio, tão comparável à vida humana e ao Homem e a tudo o que ambos têm; a diferença está nos planos, porque um é o pino da Montanha e o outro é o plano da vida; por um sobe-se e desce-se e por outro caminha-se e vive-se…

    Que os homens e as mulheres deste mundo saibam distinguir a diferença e aprendam a esperar pelo seu tempo e pela sua oportunidade; a Montanha lá estará e o Sonho é eternamente certeza.

 

Artigo do autor publicado no Jornal de Gaia em 25 de maio de 1995.