Uma Questão de Consciência / A Question of Conscience

06-12-2013 18:01
 

 Uma Questão de Consciência

Macedo Teixeira

    Ainda mal nos tínhamos acomodado na esplanada do café e já a sua amargura começara a revelar-se.
    – Sabe, estas ideias do Iluminismo, sempre mal entendidas nos seus limites, continuam hoje a espumar-se nas “modas” da ocasião.
    Subitamente, para poder apanhar o fio da meada, interroguei com cuidado: – Não estou a perceber!?...
    Sem me dar tempo para pensar, continuou:
    – Cada vez fico mais perplexo com a facilidade com que se apregoa a solidariedade. A palavra está a ficar tão gasta que mal se ouve em relação às coisas certas.
    – Coisas certas?! Que coisas certas? – perguntei mais tranquilo.
    – Sim!... Sim!... Coisas certas! – ripostou de rajada. – Realidades, em que o ato seja certeiro e puro na ajuda ou no socorro.
    – Quer dar um exemplo?! – questionei-o, para saber melhor da sua amargura.
    – Sabe, eu vou dar-lhe um exemplo, mas com algum receio, parece que as pessoas hoje são breves nos lamentos, mas rapidamente se acomodam; julgo que prestam mais atenção à parte do que ao todo.
    Senão vejamos! Não é verdade que somos um povo solidário e estamos sempre prontos para a solidariedade?
    – É verdade! – respondi, sem hesitar.
    – Mas, não é verdade também que hoje a solidariedade é praticada com espalhafato e badalada de mais? – interrogou, explicando o que pensava.
    – No socorro, a solidariedade anda misturada com o “espetáculo”; na família, com os interesses; na competência profissional, com a posição de cada um; na ajuda e partilha de sentimentos, com os grupos e a influência da divisão que têm provocado.
    E ainda a agravar mais este drama, quando devia poder continuar a juntar-se o esforço que a sociedade estava a fazer pela solidariedade de todos na convergência do estreitar da separação entre ricos e pobres, até este sentido se tornou contraditório. Uns ganham, gastam e esbanjam como se não houvesse limite; o povo fica em silêncio, chegando a aceitar como tabu os capitalistas dos milhões. Outros quase não ganham para comer, os operários dos “tostões”; o povo lamenta, mas acomoda-se perante a existência de piores situações; os mendigos aos montões.
    Entretanto, já dilacerados com a explicação, ficamos em silêncio, não dissemos palavra, até poder desabafar, amenizando: – Tem toda a razão, meu amigo! Felicito-o por este diálogo fraterno; mas, apesar de tudo isto, a Solidariedade continuará a ser uma questão de consciência.

 

 

A Question of Conscience

Macedo Teixeira 

We barely had made ourselves comfortable on the café esplanade, and his bitterness had already begun to reveal.

– You know, these ideas of the Enlightenment, always wrongly understood in their limits, continue today to scum in “fashions” of the occasion. 

Suddenly, to be able to pick up the thread, I asked carefully: – I do not understand!?...

Without giving me time to think, he continued:

– I am more and more baffled by the ease with which solidarity is proclaimed. The word is getting so worn that it is barely heard regarding certain things.

– Certain things?! What certain things? – I asked calmer.

– Yes!... Yes!... Certain things! – he riposted. – Realities, in which the act is adequate and pure in help and aid. 

– Would you like to give an example?! – I questioned him, to know better of his bitterness.

– You know, I will give you an example, but with some fear, it looks like people today are brief in laments, but they quickly conform themselves; I think they pay attention more to the part than to the whole.

Otherwise, let’s see! Isn’t it true that we are a solidary people and are always ready to solidarity?

– It is true! – I replied, without hesitating.

– But, isn’t it also true that today solidarity is practiced with too much fuss and toll? – he questioned, explaining what he was thinking.

– In relief, solidarity walks mixed with the “spectacle”; in family, with interests; in professional competence, with the position of each one; in help and in the share of feelings, with the groups and the influence of the division that they have provoked.

And aggravating even more this drama, when one should be able to continue to join the effort that society was making for solidarity of all in convergence of the narrowing of separation between rich and poor, even this sense became contradictory. Some earn, spend and trifle away the money as if there was no limit; the people remain in silence, coming to accept as taboo the capitalists of the millions. Others hardly earn to eat, the workers of "pennies"; the people lament, but they conform themselves in the presence of the existence of worse situations; the beggars on heaps.

Meanwhile, already torn apart with the explanation, we remained in silence, we said no word, until could unburden, softening: – You are absolutely right, my friend! I congratulate you for this fraternal dialogue; but, despite all this, Solidarity will continue to be a question of conscience.