Sementes da Verdade

31-07-2012 16:16

SEMENTES DA VERDADE

A Alma Social é a alma do povo (2)

 

    A alma tem por raiz vital o pensamento e revitaliza-se na Força divina, constante e edificadora, trabalhando sem descanso até ao último sopro de vida terrena. Mas ao contrário de qualquer meio mecânico, que se desloque ou complete engrenagens, em espaço visível e conhecido, terrestre ou lunar e que necessite para se alimentar de energia física renovável e de alternativas diversas, a alma ascende no nosso corpo, pela activação coordenada e disciplinada das suas características, e por este e através deste, se eleva a dimensões invisíveis e supremas; consumindo, não as energias materiais, à excepção da delapidação do corpo em que habita, mas a Energia divina, não renovável indevidamente nem permissível à alternativa independente.

   E se é nossa convicção, que já na Terra o homem ascende a Deus pela alma, sem que alguém possa Nele habitar até que o sopro de vida terrena atinja os seus limites e o corpo tenha realizado as funções que o caracterizam, em independência, em Liberdade, sentida, experimentada e na sua natural vocação; é também nossa convicção que, para completar esta particularidade da ascendência, o homem tem que descobrir, em todos os exercícios que realiza, como aproximar-se do núcleo estável que activa a alma em todas as ramificações, embora na maior proximidade nuclear, o homem se aperceba melhor que se eleva a zonas de magnitude, êxtase e transcendência.

   E tal convicção, completa-se pela consciência adquirida por esta dimensão da ascese existencial, de que o que se caracterizava em imperativos da vida humana transforma-se em vontade de desenvolver os limites desta zona da consciência, pois por ela se descobre em que consiste a Liberdade, a Beleza e o Bem e nos aproximamos do pulsar divino e das razões materiais naturais de uma parte da Energia que gravita em nós.

   Assim, cada ser humano e, por relação generativa, cada corpo social, apresentam‑se como matéria não coisificada, mas assumida por numeração e quantidade, de elementos simples e complexos-cidadãos, sistemas, subsistemas, ordens, núcleos e estruturas, em que pulsa a energia espiritual que mantém o reforço psíquico e corporal nas decisões e opções da sociedade e do homem. Esta energia tonifica a alma da raça, do credo e do Estado que lhe garante a nacionalidade, no credo que o unifica religiosamente e na liberdade em que exercita a procura dos níveis diferentes do pulsar divino, as razões fundamentadoras de laços éticos e morais para a sua elevação, dos outros e do Estado até às zonas de magnitude, êxtase e transcendência.

   Por estas razões se compreende que cada pessoa, Estado ou Nação sejam nuclearizados por universalismo e teocentrismo reconhecido numa concorrência ordinária e livre, sem sobreposição a qualquer outro Estado, pessoa ou Nação, pois pela liberdade nos é permitido o reconhecimento dos exercícios que conduzam e garantam a relação antropo-teocêntrica, isto é, caminharmos pelos limites das nossas capacidades até aos limites das nossas possibilidade que vão até às zonas divinas.

   Deus não força cada alma a concorrer para Ele, mas é imperativo que cada condutor reconheça o que conduz e que desenvolva todas as características que potenciam a alma para a revelação sadia da vitalidade e, ao mesmo tempo, prepare a sua elevação até às zonas divinas mais regulares e mais estáveis — ascender a Deus já na vida terrena, como ser capaz de realizar as condições particulares do corpo e do intelecto, para quando se elevar definitivamente, habitar em toda a plenitude a Universalidade Etérea.

   E a razão, como faculdade de apreender o pensamento e objectivar no possível as formas de idealidade, concorre nos diferentes meios de conhecimento e de experimentação, em condições de evidência e distinção, bem capazes de orientarem a vontade e o corpo para os movimentos naturais de vontade superior e transcendente; assim o Homem se esforce nesse sentido, pois não só conseguirá descobrir em que consiste a Liberdade, o Bem e a Verdade como irá diminuindo a acção e dominância dos impulsos inferiores, que em alguns casos são geradores da descrença na nobreza da vontade e seus superiores princípios e inclinam alguns seres humanos na cooperação da vontade cega do corpo.

   Quando a razão social e humana entende e compreende, percorrem‑se os momentos supremos do estar no mundo e atingem-se os resultados mais desejados no voluntarismo da aprendizagem: a razão conhece, entende e participa. Quando a razão participa e não conhece, a alma entende mas não satisfaz, nem se satisfaz plenamente, e os resultados definem a ignorância activa e inferior; e, se a razão se vilipendia com o corpo, voluntariamente e pré-avisada, ocorrendo toda a espécie de gozo e o penhoramento da alma nas características da irracionalidade e insânia, a alma entende na dor e no pecado, recebe mas não irradia e sente mas não participa; atingem-se os resultados do caos da confusão e das trevas.

   Por estes laços de reflexão e de sabedoria, descobrimos como confluem e como se ordenam as diferentes necessidades naturais e sociais e como estas são geradoras de equilíbrios e desequilíbrios da ordem que ritma o corpo, a sociedade e o Universo. E, em síntese, pode concluir‑se que a alma está para a razão como esta está para o corpo e que a primeira relação é de intimação da razão, no reconhecimento da Liberdade do Bem e da Verdade, e a segunda relação é de ordenação do corpo, coordenação das vontades e assunção das responsabilidades na amostragem e controlo, uma vez que o corpo humano e social manifesta em concreto e visível o estado de sanidade ou de volúpia; sendo em conjunto estas duas ordens e meios, responsáveis pela harmonia ou desarmonia do universo social e humano, e, em extremo, participantes na Liberdade eterna ou seus combatentes, o que é o mesmo, combatentes contra si próprios.

   E por muito que nos custe aceitar, este estado de autodestruição, maligno e delapidador do corpo e da alma, como resultado do vilipendiar da razão e do corpo, tem-se alastrado muito nos nossos dias e está a ser preferido por todas as camadas sociais e não só pelos mais desavisados, como seria de esperar. Tem-se generalizado com intensidade e redundância e ocorre-nos a crença de que as forças racionais ou de condução governativa, e dos governantes e outros responsáveis, se vão tornando inoperantes e impotentes perante estes resultados e se vão tornando servidores destes valores, porventura sem consentimento prévio; tornam-se servidores, porque se tornam flexíveis à libertinagem de compromissos personalizados pelas metas de poder quantitativo, sem o correspondente e imprescindível poder qualitativo.

   Esta relação tríade — alma, corpo e razão — de um povo ou de um Estado, para se manter qualitativamente sublime, tem que ser quantitativamente ajustada, sem significar qualquer forma de segregação ou de exclusividade. E, se o homem não pode reter a liberdade, sob forma de reserva individual, na proporcionalidade das dificuldades e na temporalidade do acontecimento, o que proporcionaria a solução razoável ou boa de todas as situações difíceis (não deixando de nos merecer o reparo de que com esta solução o desenvolvimento seria, certamente, mais limitado e acomodado às velhas experiências), compete ao Estado assegurar, por todos os meios lícitos e justos, a tranquilidade e segurança dos cidadãos; garantir a ordem evolutiva ou involutiva, quando for necessário, da matriz ou à matriz essencial da civilidade; para que a proporcionalidade com o tempo se estabeleça em função das condições individuais e colectivas, sem que estas tenham que oscilar entre o luxo e a miséria, o crime e a santidade: o mundo não será santificado se houver nele criminosos, e quando se tem a alma suja, todo o pano é insuficiente para a esconder e toda a água não basta para a lavar.

   A alma do mundo contemporâneo percebe-se com o alastrar intenso, perde-se na sujidade das mãos criminosas, na tentação dos pensamentos e dos actos, nas vontades despudoradas e encobertas pelas sombras do poder humano e, que vão progressivamente abortando as funções de serviços.

   Portugal tem forçado debilmente esta invasão e, em alguns casos, tem criado condições que favorecem a aceitação destas acções pela ideia comum de que os erros do passado impediram experiências, de que hoje o desejo e a franca liberdade de as viver condicionam a previsibilidade, e os resultados são aceitáveis e controláveis. Sem qualidade nos pensamentos e nas acções que relacionam o homem com outro, com o Estado e com a Lei, todos os desenvolvimentos tecnológicos e riquezas materiais, mesmo que sejam acessíveis a todos e todos os possam utilizar; sem um conhecimento qualitativo e acções sensíveis proporcionais, tornar-se-ão em meios de denominação e de esbanjamento. Portugal, pela acção e conduta dos governantes e demais responsáveis, necessita de ser inflexível na organização e execução de componentes formativas culturais e nacionais que preparem, num desenvolvimento moderno e consentâneo com as nossas potencialidades, o voluntarismo nos serviços e empenhamento na qualidade, para que a nossa memória cultural sirva, no que for atualizável de substrato na activação das características sentidas por D. Afonso Henriques, Luís Vaz de Camões e outros que a nossa história ilustra, que os tornou portugueses; assim nos torne sempre a nós, e aos nossos descendentes os torne em nós e nos que nos antecederam.

   Estamos certos que assim será, se suceder a imperativa harmonia de serviços e de exercícios regulares, de resultados a priori parcialmente previsíveis de qualidade e quantidade ajustável.

   À alma é conferida a anterioridade do tempo, da quantificação e do juízo; ao corpo é-lhe conferido divinamente a proporção, o movimento e a completude de formas; se viverem em equilíbrio e união e sem qualquer espécie de dominação, ambos podem revelar-se na materialidade, conduzir-se na liberdade da Liberdade, uma e outro na mesma viagem, sem separação nem estranheza e habitando unitariamente o mesmo paraíso.

 

 

Autor: Macedo Teixeira; Obra: Sementes da Verdade; Fotocomposição e Impressão: ROCHA/Artes Gráficas, L.da; Julho de 1992; págs. 29 a 32.