O Porquê do Associativismo

06-07-2012 16:06

O Porquê do Associativismo

O Porquê do Associativismo leva-nos a reconhecer que o sentido familiar será sem dúvida uma das suas razões.  

Neste sentido e aproveitando a imagem é meu desejo mostrar que o Associativismo é uma razão da natureza humana e as suas formas uma necessidade para a vida.

Para o efeito, começarei por postular, que as instituições sociais como centros de Cultura, Recreio e Desporto serão também centros de convívio e locais para a experiência cívica e vivência dos valores humanos, ou seja, serão lugares de intervenção, associação e valorização da vida humana.

Assim sendo, poderá dizer-se que nestas instituições começaremos logo a experimentar a vida associativa através da possibilidade da revelação dos nossos talentos e capacidades. Pois as instituições, enquanto valores de referência, permitirão a orientação do homem na revelação da sua individualidade e da sua competência nos vários domínios, nomeadamente no exercício da autonomia e na aquisição do gosto para trabalhar com os outros na realização de objetivos comuns.

Quando me refiro às formas de associativismo como uma necessidade para a vida do Homem, estou a confirmar aquilo que já sabemos. Que o Homem não é autossuficiente, que é um ser gregário e social, que necessita do outro para poder avaliar-se e situar-se num quadro de referência dos conhecimentos e dos afetos. Que é ele que se apropria do espaço para retirar daí os fatores para a sobrevivência, começando pelo alimento e indo até ao abrigo. Que é ele que o estrutura e organiza para se integrar e mobilizar através do Grupo e participar nas suas práticas para se identificar e desenvolver no sentido racional, mas também desenvolver no sentido moral e ético que virá depois a enraizar nos seus lugares de vivência.

E estou a confirmar também, que com esta razão, nascerão os projetos que o homem idealiza e para os quais ganha consciência que não será suficiente agir sozinho, procurando por isso que a sua vontade resulte em comunhão, pois ele sabe que só em conjunto será capaz de superar as circunstâncias da ordem natural em que cresce pela transformação e realização da ordem social em que vive.

Por isso, poder-se-á dizer que será nesta necessidade de completar-se e revelar-se nas suas potencialidades que o homem tende para o agrupamento e para a comunidade, pois é nela que recebe e transmite sentimentos de afeto, manifesta os seus ideais e promove a sua legitimidade. Sendo também na comunidade, com relevância para a comunidade associativa, que encontra as parcerias e motivações para a realização dos projetos e afirmação dos valores e do património que vai engendrando para si e para a riqueza coletiva. Por fim, a culminar com este êxito, poderemos referir que vai ser nesta teia de relações complexas que surgirá algo de muito importante, para a garantia da sua conduta nos modos de ação social, mas também, da consequente preservação dos seus bens em todas as situações, especialmente nas situações de maior crise. Pois o homem ao ter consciência que não poderá viver sozinho e sem regras, irá descobrir que a melhor forma de as fazer prevalecer no grupo e garantir deste modo também a sua própria vontade pessoal, é associar-se numa conduta social que tenha como fim, ser substrato da norma e ser consequência do respeito à Lei e amor ao próximo, ou dito de outro modo, tornar-se na lei de todos e para todos.

Entretanto, será um dever destacar com elevado reconhecimento, que as coletividades como a família, a escola e o grupo surgem como realidades complexas, que o homem com grande sacrifício organiza e estrutura numa base racional, tendo em vista completar-se no conhecimento, no lazer, na procriação e, em tudo aquilo, que o promova e o faça tornar-se no que é: “Homem em plenitude”. E será também meritório reconhecer-se que por ser o principal agente, em quem recaem as forças da ação social é também ele o primeiro a desencadear todas as suas defesas, no sentido de encontrar formas de adaptação e equilíbrio, para proteger as instituições perante as crises e os abalos inesperados dos sistemas. Neste contexto a sua ação para interagir torna-se mais insistente pois ao sentir-se enfraquecido na razão e nos juízos pela confusão que as crises geram, o homem tende a procurar equilíbrio nos conjuntos sociais, nomeadamente nos lugares e associações onde diariamente se reúne e onde pode partilhar os seus sentimentos de insegurança e, por ventura, de descrença no valor da sociedade de que é parte e na qual se completa e se promove.

Contudo, não poderemos deixar de afirmar que será nas coletividades, centrando-se na família e estendendo-se às Associações, que o homem irá buscar em todas as situações, em especial, nas situações de crise, as compensações psicológicas (através de sentimentos emocionais positivos), as compensações morais (através da partilha de sentimentos comuns) e as compensações racionais (através do recobro da confiança nas suas ações)

Assim, poderemos inferir em consequência que estas deverão ser razões suficientes para levarem o homem a reconhecer ser um dever de absoluta necessidade reconhecer como necessárias e cooperar voluntariamente no desenvolvimento e manutenção das instituições quer para poder melhorar as suas condições sociais quer para fortalecer as suas capacidades e o seu estatuto de direito social e cultural. Reconhecer que nas coletividades, o ser humano ganhará força e coragem para acreditar que valerá a pena destinar-se no servir os outros, pois com eles obterá compensações que sozinho não seria capaz. Aliás, neste contexto ganhará ainda mais sentido a necessidade do Associativismo pela possibilidade de maior respeito na promoção dos direitos fundamentais da pessoa humana, desde logo, o direito de cidadania, o direito de viver em prosperidade, o direito de se poder associar e o direito de se poder reunir, para se autorrealizar e ser membro ativo da sociedade, ou ainda, para poder comungar da paz e segurança de toda a comunidade.

Mas nem toda a realidade será linear na vida associativa, uma vez que poderão surgir nesta dinâmica evolutiva conceitos a priori negativos com evidência para as roturas e as descontinuidades, resultantes da necessidade do progresso cultural que ao forçarem pelo confronto da avaliação dos valores vigentes, em certas ocasiões, criarão dificuldades na manutenção do paradigma tradicional exigindo a descoberta de soluções que o melhorem ou exigindo a descoberta de um novo e mais eficaz. Em consequência, enquanto esta crise não for solucionada poderão as formas de convívio associativo tornar-se muito frágeis, fazendo o seu efeito desanimar o grupo podendo levá-lo, em casos extremos, à debandada ou mesmo à sua extinção. No entanto, salva a exceção dos casos limite, quando surge esta situação temporal de “revolução” deve a mesma considerar-se como fator mobilizador e capaz de intervir na renovação do papel da Instituição e nos objetivos que a determinam como um valor social.

 E para reforçar melhor o pensamento com que tento estruturar a minha argumentação, vou evocar do Congresso Nacional das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto – abreviado pelo título “ Um Congresso de Mudança” Almada 1993. Do qual, confesso sinceramente, que me entusiasmaram as várias comunicações proferidas e só por uma questão de maior sintonia com a minha reflexão, destaco alguns excertos da comunicação do Professor Carlos Ribeiro, Catedrático de Cardiologia da Faculdade de Medicina de Lisboa. Desde logo, pela sua experiência e paixão pelo Associativismo, depois pelo saber fazer profissional que ligam as dimensões do saber ser, do saber fazer e do saber estar, uma trindade que evidencia o indivíduo, a ação e a Pessoa e que serão determinantes na vida Associativa.

Diz este médico do coração, que as Instituições, quer sejam religiosas, políticas, académicas, recreativas ou sociais, passam por três etapas em que é possível identificar uma curva evolutiva institucional e susceptível de justificar os êxitos e os fracassos obtidos.

A primeira fase é a fase do estádio nascente, é uma fase fluída, quente e apaixonada com objetivos institucionais bem definidos. Existe uma grande solidariedade e atração entre os pares, verdadeiros Pioneiros que se esforçam na criação e consolidação da Instituição. A Instituição é tudo e nela todos se projetam. São exemplos desta fase a Igreja das catacumbas, o aparecimento da Ordem dos Franciscanos, a implantação de um Centro Cultural, duma Coletividade de Recreio, ou duma Sociedade Científica ou Académica.

A segunda fase é a fase da Instituição triunfante, surge no momento em que os pares já são os descendentes dos pioneiros, acrescidos de alguns aderentes. Surge o momento em que a Instituição se tornou apelativa para os pares, que para conviverem utilizam regras que visarão o interesse das partes, mas nem sempre o interesse do todo. Surgem em consequência contendas teológicas/científicas e culturais onde as Personalidades fazem valer a sua força e o seu poder. Verifica-se a renúncia aos objetivos institucionais e a perda das esperanças dos primeiros dias. Desaparece a solidariedade entre os pares e surge o protagonismo.

A Instituição passa assim a depender dos objetivos perseguidos e dos êxitos obtidos por cada uma das Personalidades tornadas heróis. Esta fase corresponderá à da Igreja triunfante, ao aparecimento dos Doutores na Ordem dos Franciscanos, e dos Mecenas nos Centros culturais ou nas Sociedades de Recreio e aos pretensos iluminados nas Sociedades Científicas ou Académicas.

A terceira fase, é a fase da Instituição rotineira, correspondendo ao momento em que a vida da Instituição se torna num hábito, os seus objetivos esquecidos e os Pioneiros e os Heróis não são substituídos. Há rituais que continuam, mas não surgem novas conversões. Os pares digladiam-se, formam-se seitas movidas de interesses de afirmação mesquinhos. As Personalidades agora já não se revêm na Instituição e tentam imitar os heróis que noutras ambiências não são ressuscitáveis. São exemplos desta etapa, as Igrejas de bairro onde já não existem irmãos mas eventuais praticantes, as Sociedades de Recreio com Direções que seguem a rotina, o Centro Cultural sem animadores, as Sociedades Científicas ou Académicas fechadas sobre si mesmo.

 Apesar destes sucessos e fracassos, o autor não deixa de destacar positivamente nestas fases, a ação marcada pelos Pioneiros e pelos Heróis mas também pelos rotineiros. Evoca também a história das identidades e da força que as anima no trajeto social e na valorização temporal das obras humanas. E fá-lo com elevado otimismo, pois não me parece aludir a qualquer sentimento efémero sobre a importância e necessidade do Associativismo, como razão tão necessária como voluntária para o preenchimento da existência humana. Aliás, em forma de conclusão, afirma este médico o seguinte: Da minha experiência Associativista observei sempre que as Instituições duradouras eram feitas e vividas com paixão, com lutas, com alegrias e tristezas, tendo o passado como referencial, o presente desenhado para uma vivência no grau do possível e o futuro planificado sempre com muito realismo.

O Associativismo tem sido uma constante na história da humanidade, embora na sociedade portuguesa, tenha sido difícil a obtenção da sua liberdade plena. Só em 1907 a Lei de 14 de Fevereiro veio proclamar a formação livre de Associações. E a Constituição de 1911 (no artº.3º.nº.14) declarou livre o direito de Associação.

As palavras sócio, associado e companheiro estão profundamente ligadas. Julgo contudo, tornar-se necessário avaliarmos o seu valor e significado à luz do que quer dizer: o Homem é um Ser Social, pois é a sua natureza que lhe exige que se agrupe e coopere. Completa-se pelas práticas e experiências e liga-se aos outros com vista às categorias sociais, nomeadamente à categoria de Associativista, a qual lhe deverá ser atribuída, tendo em conta três princípios:

 -A Solidariedade, que se traduz na nossa sensibilidade em relação a outro ser humano e, na vontade consciente, de o querer ajudar por meio de um acordo comum e sempre com a melhor intenção.

 - A Liberdade como condição para aspirar atingir o sentido dos limites, deste estado de consciência e dos fins para que concorre a ação humana: a Humanidade e a realização sadia de cada um dos seus membros, sem ter medo do “fator tempo” para correr ao encontro das suas aspirações.

  -A Transcendência como capacidade para se superar a si mesmo, para não olhar apenas de fora o Associativismo na procura de explicações para todas as situações, em vez de o viver e redescobrir para saber acolher melhor o outro na sua proximidade e integração.

 E por fim, com base neste valor ou categoria, gostaria de terminar esta reflexão com um sentimento pessoal e com uma imagem que extraí do filme Forrest Gump, que tenho ainda presente na memória, pois vi a personagem deste filme como alguém que na realidade corria pela vida e pelo sonho ao mesmo tempo que se libertava das tensões que o atrofiavam. Possa então, esta ação e arte servir-nos como sinais para continuarmos a viver a nossa vida na forma associativa, familiar e até profissional com empenho, amor e espírito de missão. Sirva também para continuar a sentir que o Associativismo é um valor necessário que se assume voluntariamente para andar em direção à condição de seres humanos que se libertam de todas as muletas, procurando manter relações humanas no sentido profundo e associando-se nos projetos culturais para crescer mais e melhor.

Possam permitir que não tenhamos medo da insegurança e de não sermos capazes em conjunto de realizarmos os nossos ideais. De rompermos com os estados de apatia e mobilizarmos as consciências dos poderes públicos, culturais e cívicos, porque às vezes, também eles andarão “adormecidos”.  

E, finalmente, motivar-nos para continuar a nossa ação movidos pela paixão do dever e do sonho, pois poderemos não ser muito inteligentes para descobrir o nosso destino ou para saber voar como uma pena ao vento, mas se tivermos vontade e coragem o coração fará o resto.