Existe um pensamento especial no poder dos pensamentos proverbiais

15-06-2012 23:05

Existe um pensamento especial no poder dos pensamentos proverbiais

                                 

    Por uma “escadinha de chuva”,quantas vezes sonhamos subir os degraus que distam da Terra ao Céu; sonhamos que este nos parece tão perto, e a nossa vontade  diz que é tão fácil lá subir? Uma espécie de sensibilização num sonho como que a arranjarmos forças para vivermos a Liberdade e sacudirmos o corpo das recordações que nos perturbam e são objecto de angústia. Ah! Se isso fosse possível, se isso não fosse uma ilusão e tivéssemos ao nosso alcance uma tal possibilidade para a ocuparmos nos nossos desejos de purificação libertadora, tenderíamos, certamente, a subirmos até ao Céu para limparmos todos os sofrimentos, que não fizemos nem sabemos porque existem .

   De um tal sonho, sejamos ao menos espectadores, num tempo em que, obrigados pelo facto de chover, passemos a estar livres de todas as ocupações que nos restrinjam a liberdade e que não sejam senão a chuva ou outros obstáculos naturais, que sendo bens, nos limitem, e, em alguns casos, nos obriguem a estar obrigatoriamente “ocupados”, por não podermos sair à rua. É que não basta estar ocupado com o que produzimos e construímos, vestimos e comemos; é fundamental termos a noção destas realidades e do seu significado; não vá a ocupação nos ocupar a Vida,ou a nossa vida perder-se no egoísmo da ocupação.

   Vem a propósito um acontecimento que motivou esta análise sobre as ocupações; aliás, um acontecimento que esteve na origem da certeza que vivemos num mundo em que tudo quanto existe tem o seu significado e desperta em nós aspectos de relação e afinidade.

    Estava um dia muito quente e o motivo da minha viagem era tão agradável, quantas as combinações que me eram possíveis nesse tempo de transporte e estadia de visita. Não tinha muita pressa; dependia de um conjunto de circunstâncias que justificavam uma atenção preocupada pela descoberta de aspectos para a memória e motivos para o conhecimento. Não desejava combinar o tempo com excessos nem planeei o que não pudesse concretizar; apenas uma viagem, um encontro com locais e pessoas e uma visita para resolver um assunto que há bastante tempo me preocupava. Aliás, sentei-me por diversas vezes em locais que descobri e me atraíram facilmente. De um modo geral,mais pela satisfação que encontrava em cada momento que vivia do que pela preocupação de descobrir outros motivos que despertassem a análise ou a vontade da descoberta e procura; julgo que a satisfação de uma viagem reside mais na mudança e na surpresa do que nos motivos que se planeiam. E, aconteceria assim, se o facto que aconteceu não despertasse em mim um sentimento raro e uma vontade de exaltação; um sentimento que me fez meditar no Mundo com outras preocupações e um sentido diferente; mesmo em relação à compreensão deste fenómeno e sua consequente analogia!

    Num lago atractivo e  refrescante, onde os movimentos leves e brandos da água que o Sol tangia davam lugar a imagens raiadas de luz brilhante e pura, deparei com uma pequenina borboleta que aos poucos morria por afogamento.Tinha ficado presa numa pequena massa viscosa que boiava no lago e lhe servia de base de sustentação no ondular da água, que ainda que fosse brando e suave aos olhos de quem o contemplava, era suficientemente causador dos perigos que corria aquele pequenino insecto.. Era do tamanho de um pequeno botão e a massa viscosa agarrava-a e prendi-a de tal forma que as asas não se moviam e os sinais de vida eram já muito ténues; aliás, não fora a minha ocupação ser mais de observador que de passeante do Mundo, e esta borboleta não se teria salvo nem eu teria percebido o que poderemos fazer através das nossas ocupações! De imediato e com muita cautela, separei este pequeno corpo da matéria que a segurava; libertei-a da água e suspendi-a no tronco de uma árvore que estava próxima, para que fosse capaz de voar de novo para os limites da Vida, e da vida que lhe era natural e sua. Fiquei ainda algum tempo a contemplá-la e, ao vê-la debater-se com as dificuldades da libertação, pedi por instantes a Deus que a ajudasse a encontrar o caminho e lhe desse forças para voar de novo na busca do alimento, que a fome deveria ser muita e a debilidade já não a ajudava.

    A partir desse momento fiquei a congeminar comigo sobre a comparação da Ordem natural com outras ordens, nomeadamente a social e na qual está presente a necessidade de organização geral. Neste incidente, pude aperceber-me que até nas ordens mais regulares e nos ritmos de transformação, ocorrem factos que excedem os limites da nossa compreensão. E ao descobrir que tudo é governado com absoluta perfeição e que tudo ocorre, segundo a vontade do Criador; como compreender, que até os seres mais dependentes, que são naturalmente inclinados na protecção e segurança, caiam nos desvios e incidentes humanamente provocados ou naturalmente ocorridos? Meditei, que existe um pensamento especial no poder dos pensamentos proverbiais, e que eles são as primeiras explicações e as mais consoladoras na nossa desolação perante factos tão inexplicáveis, como aquele que acabava de assistir; lembrei-me do que me haviam ensinado em aspectos doutrinais:”Deus protege uns e manda proteger os outros”

 

Texto do Autor - Macedo Teixeira - Entre o Sol e As Ocupações-

Porto: Editorial Panorama, Lda, 1997, P. 13 a 16.