Caminho de Luz e Sombra

03-06-2020 19:19

     Caminho de Luz e Sombra (Texto 10)

Caminho de Luz e Sombra (Texto 9)

Ler mais: https://partilharsaberes.webnode.pt/blog/
 
Caminho de Luz e Sombra (Texto 9)

Ler mais: https://partilharsaberes.webnode.pt/blog/

 

    O Toninho, ainda a trautear as palavras do pai, exclamara: – Como são lindas as estrelas, Pai! Se calhar está ali a estrela do menino Jesus! – acrescentara ainda com o fascínio do que aprendera sobre o Natal.

 

    – Essa é outra realidade, de que te falarei noutra ocasião! Agora não temos tempo para explicações! – rematara o pai concluindo. – Já estamos a chegar a casa do homem. Reza para que ele tenha bilhetes para nos vender. Sem eles não poderemos ver o filme que há tanto tempo ouço dizer que é muito bonito!

 

    A partir desta altura, começaram a andar mais depressa, dando as mãos um ao outro enquanto subiam pela rua perpendicular ao carreiro, por onde tinham vindo, para chegarem até junto da porta onde morava o bilheteiro.

 

    – Boa noite! O senhor não sabe quem sou, mas eu sou familiar de pessoas que o senhor conhece bem e que são suas amigas! – exclamara o Amaral, em jeito de apresentação. – Olhe, por exemplo, o senhor não conhece o Zé “torneiro”? Ele é meu primo! – dissera com afeto. – Ele é um grande industrial da terra, não é? – interrogara, com solenidade.

 

    – Ah, sim! Sim, conheço-o muito bem! De facto é um industrial muito perfeito e muito respeitado na nossa terra – afirmara o bilheteiro em tom coloquial e a abanar a cabeça em sinal de concordância. Depois, mais desembaraçado nas palavras, perguntou: – Mas, qual é o problema que o traz a minha casa?

 

    – Desculpe por não saber a sua graça, embora ouça dizer muito bem do senhor – observou Amaral com deferência.

 

    – Mas o que é que o senhor deseja? – voltou a insistir, na expectativa do problema.

 

    – O meu nome é Amaral, e a razão que me levou a vir a sua casa foi porque prometi aqui ao meu rapaz que o levaria no próximo domingo ao cinema. Queria que víssemos o filme Os Dez Mandamentos”, que vai ser exibido no Cine Teatro almeida e Sousa, onde o senhor é o responsável pela bilheteira. E como no domingo, com certeza, já não haverá bilhetes, apressei-me a vir comprá-los hoje antes que se esgotassem.

 

    – Oh! Meu caro senhor, mas eu já não tenho bilhetes, já estão esgotados! – exclamara o bilheteiro com alguma emoção.

 

    – Estão esgotados?! Mas ainda faltam alguns dias para a exibição do filme! – retorquira Amaral com grande tristeza.

 

    – Sim! Sim!... O senhor Amaral tem razão, mas as pessoas não largaram a bilheteira para fazerem a marcação de bilhetes para o próximo domingo. Aliás, já não vamos abrir a bilheteira ao público porque acabei de entregar os últimos bilhetes.

 

    – Queira desculpar, senhor, mas aqui para o meu rapaz não será possível arranjar-se pelo menos um bilhete? – suplicara emocionado. E acrescentara de seguida: – Viemos de longe com a ideia de que ainda não seria tarde, e afinal já não há bilhetes. Veja como o meu rapaz está tão triste, ele ainda é um menino; por favor, não o deixe ficar neste estado. – apelava o Amaral para o coração do bilheteiro.

 

    – Mas, senhor Amaral, se o senhor tivesse ido no domingo à bilheteira, também lhe arranjaria bilhetes como arranjei aos outros.

 

    Depois, como forma de partilhar da tristeza comum, exclamara:

 

    – Ainda por cima, sabendo agora quem é, e a que família pertence, fico com pena de não ter nenhum bilhete!

 

    – Que havemos de fazer senão lamentar a pouca sorte que tivemos! – desabafara Amaral com resignação. E, de modo repentino, despedira-se respeitosamente dando a mão ao seu menino, ao mesmo tempo que procurava conter-lhe as lágrimas, efetuando o movimento de descida em direção à perpendicular do caminho de regresso a casa. O Amaral olhava o céu, como a suplicar forças para a caminhada que, a partir daquela altura, já não fariam com a mesma alegria de quando saíram. Depois, com passo ligeiro e já recomposto, exclamara com mais otimismo:

 

    – Vamos, rapaz! Agora é preciso quando chegarmos a casa animar a tua mãe e prometer-lhe que quando voltar a ser exibido este filme eu comprarei os bilhetes a tempo! – E, sem deixar esmorecer o sentimento de compensação que procurava para a angústia que o invadia, começara a contar algumas passagens bíblicas sobre a saída dos hebreus do Egito, através das águas do mar Vermelho, em direção à Terra Prometida; afinal, começara a contar o que ouvira falar sobre a história do filme Os Dez Mandamentos” e o que lera na Bíblia, especialmente durante o tempo em que tivera contacto com o Seminário.

 

    – Sabes, Toninho, muitos filhos de Israel e as suas famílias foram com Jacob para o Egito. (iv) Este povo hebreu tornara-se mais numeroso e mais poderoso que os egípcios. Por isso, o rei, tendo medo que os israelitas os destruíssem, ordenou aos seus chefes para os oprimirem com trabalhos muito duros, como, por exemplo, fazerem os tijolos de barro para construírem as cidades. Depois, não satisfeito com esta atitude, por o povo hebreu estar a aumentar cada vez mais, ordenara às parteiras, Séfora e Fua, que quando assistissem aos partos, se nascessem rapazes que os matassem e se fossem raparigas as deixassem viver. Como as parteiras não cumpriram a ordem dada, por serem tementes a Deus e terem conseguido enganar o Faraó, dizendo que as mulheres dos hebreus não eram como as dos egípcios, pois eram vigorosas e davam à luz mesmo antes de chegar a parteira, o Faraó dera a seguinte ordem a todo o seu povo: “Lançareis ao rio todas as crianças do sexo masculino que nascerem aos hebreus e deixareis viver todas as raparigas”.

 

    Ora, como tinha nascido naquela altura o menino Moisés, a sua mãe, que era filha de um hebreu que se chamava Levi, colocou o seu filho num cesto de vergas num canavial da margem do rio Nilo. a filha do Faraó, que não tinha filhos, estando a banhar-se no rio, avistou o cesto no meio do canavial e mandou buscá-lo pela sua serva. Quando abriu o cesto viu que era um menino a chorar. Teve pena dele e disse: “É um filho dos hebreus”.

 

    Então, a irmã do menino que acompanhava o cesto no canavial disse à filha do Faraó: “Queres que te vá procurar uma ama, entre as mulheres dos hebreus para criar este menino?” “Vai”, disse-lhe a filha do Faraó, e a irmã de Moisés foi buscar a sua mãe.

 

    A filha do Faraó disse-lhe, então, o seguinte: “Leva este menino. Amamenta-mo, e dar-te-ei o teu salário”. A mãe levou o menino e criou-o, e quando Moisés cresceu, entregou-o à filha do Faraó, como tinham combinado, tendo sido adotado por esta e lhe dado o nome de Moisés, “por ter sido tirado das águas”.

 

    Moisés fez-se homem e, certo dia, indo reunir-se com o povo, viu um egípcio a bater num hebreu. Após confirmar que ninguém se encontrava em redor, matou o egípcio e enterrou-o na areia. No dia seguinte, viu dois hebreus a brigar. Disse ao agressor: “Porque bates no teu camarada?” – E o homem respondeu: “Quem te nomeou chefe e juiz entre nós? – Queres matar-me como mataste o egípcio?” Moisés ficou amedrontado e pensou: “Portanto, não há dúvida de que o facto é conhecido”. Realmente, o Faraó soube do que se tinha passado, e mandou prender Moisés para o matar, mas este conseguiu fugir e foi refugiar-se na terra de Madian.

 

    Chegado a esta terra, sentou-se junto a um poço e adormeceu escondido entre os arbustos. Sem saberem da sua presença, as sete filhas do sacerdote de Madian foram tirar água do poço para levarem para casa e encheram também os tanques para darem de beber ao gado do pai.

 

    No momento em que tiravam a água, aproximaram-se alguns pastores que as obrigaram com violência a abandonar o poço. Moisés acordou com os gritos das raparigas que procuravam defender-se dos malfeitores. De imediato, pegou no cajado que lhe tinha servido para se apoiar e enfrentar os ventos do deserto e lançou-o contra os pastores para libertar as filhas do sacerdote.

 

    Como forma de pagar este gesto heroico de Moisés, o sacerdote convidou-o para comer com ele e a sua família, depois propôs que assistisse a algumas danças, acabando por ficar a viver com eles. Na sequência deste convívio, casou com Séfora, que lhe deu um filho, ao qual Moisés pôs o nome de Gerson.

 

    Decorrido muito tempo, morreu o rei do Egito, mas os filhos de Israel continuavam a viver na escravidão. Os lamentos e gemidos dos hebreus eram tão fortes e tão dolorosos que chegaram até Deus, o qual se compadeceu deles e lhes enviou Moisés como seu libertador.

 

   Macedo Teixeira, Caminho de Luz e Sombra, Chiado Editora, Lisboa, 2013, pp. 36 a 41.